Ex-comerciária faz dissertação de mestrado sobre a saúde dos trabalhadores do comércio

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“O estudo nasce a partir de uma demanda do Sindicato dos Comerciários, em 2017, para conhecer mais sobre a saúde e o adoecimento dos trabalhadores”. Assim define a Assistente Social formada pela UFRJ, Daphne Braga, que no final de 2019 defendeu sua dissertação de mestrado com o tema “Trabalhadores Comerciários: uma experiência do ‘saber operário’ na construção de conhecimentos sobre vigilância em saúde do trabalhador”.   dissertação

Foi em um curso permanente da Fiocruz, que reúne pesquisadores e sindicalistas, que Daphne Braga conheceu mais sobre a realidade dos comerciários, quando ela encontrou alguns diretores do Sindicato que também participavam dos encontros que debatem a saúde dos trabalhadores.

Na verdade se tratou de um reencontro, pois Daphne Braga também já foi comerciária: “O meu primeiro emprego foi na Mesbla, no Barra Shopping, onde exerci a função de vendedor-caixa, no início da década de 1990. Fiz toda faculdade trabalhando no comércio varejista, mais especificamente em Shopping Center. Trabalhei, posteriormente, nas Lojas Lápis de Cor do Barra Shopping e também do Norte Shopping”. 

Naquela época ela conheceu bem a profissão que anos depois iria pesquisar. “Trabalhar no comércio não era fácil. Uma jornada de oito horas controladas pelo cartão de ponto, com sábados, domingos e feriados, onde tinha hora para entrar e, muitas vezes, não tinha hora para sair, porém eu gostava da rotina e me sentia realizada”, afirma Daphne. 

Saúde e assédio na vida dos comerciários

Em sua dissertação de mestrado, a segunda da sua carreira, Daphne contou com o apoio do Sindicato dos Comerciários para fazer sua pesquisa. Ela reforça a importância da entidade no dia a dia dos trabalhadores: “Vocês fazem parte de um sindicato que eu tenho muito respeito pela luta por melhores condições de vida e trabalho de uma categoria que é extremamente diversificada, com desafios que somente quem está trabalhando como comerciário tem a real dimensão das lutas por dias melhores em tempos tão difíceis”.

Na pesquisa, Daphne abordou situações que afligem a saúde e a dignidade dos comerciários. “A questão de gênero é uma tônica, inclusive pela grande participação da mulher no setor. Assédio moral e, mais especificamente no caso da mulher, o assédio sexual, é mais comum do que podemos imaginar quando entramos numa loja, num supermercado, num shopping”. 

Ela fala ainda sobre as dificuldades diárias das comerciárias e dos comerciários.“Grave, ainda, é a questão das trabalhadoras quanto ao acesso a banheiros durante a jornada de trabalho. Não há autonomia, a substituição no posto de trabalho para ir ao banheiro, quando existe, é inadequada e não atende a urgência. Devido ao fato, é comum mulheres terem problemas diversos de trato urinário. Já ouvi relatos de pessoas que usavam fralda para trabalhar”, declara. 

Pela pesquisa, 62% dos trabalhadores comerciários já sofreram acidente de trabalho, tiveram alguma doença relacionada ao trabalho ou fizeram tratamento médico/psicológico. Porém, ainda persiste a falta de reconhecimento do afastamento por conta de uma doença relacionada ao trabalho. Entre os casos registrados na dissertação de mestrado estão queda no local de trabalho, acidentes no trajeto casa-trabalho-casa, desvio de função, problemas de colunas, reforço repetitivo, afastamentos por saúde mental e assédio. 

Daphne Braga

“São muitas questões que pelas entrevistas que eu fiz, está todo mundo adoecendo pela pressão, o sofrimento tem sido grande, pois não depende só de você ser um bom vendedor, depende de uma política econômica boa. Temos pessoas vendendo pela internet, Instagram, sem dia e nem horário para acabar”, relata Daphne Braga. 

Riscos da profissão e pandemia

Daphne também identifica riscos e problemas que precisam ser enfrentados pela categoria. “Assalto, desvios de função, falta de treinamento e adequação do uso de Equipamentos de Proteção Individual (EPI), irregularidades com o banco de horas, carregamento excessivo e inadequado de peso, foram relatos recorrentes”.

Em relação ao momento de pandemia e os riscos para os comerciários, Daphne Braga avalia que “se para se sentir seguro é preciso ficar em casa, então o Estado deveria ser o garantidor dessa situação. Claro que tem situações do trabalho essencial, dentre os 27 segmentos do comércio, o que impacta é o trabalhador que está no supermercado, que não pode parar, mas que ainda está desorganizado. Inicialmente não havia preocupação da empresa em fornecer álcool em gel. O que me preocupa é a invisibilidade desses  trabalhadores, o que é mais essencial do que a vida?”, pergunta a pesquisadora.

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